Firmino Júnior: As burocracias sentimentais

Que o Brasil é um país burocrático todo mundo sabe. Se você já teve que lidar diretamente com o poder público deve saber melhor ainda. No Brasil as coisas acontecem mais ou menos assim quando se trata da questão da educação que é a área com a qual trabalho: primeiro você preenche um formulário pela internet que provavelmente faltará algo, na maioria das vezes não por sua culpa.  Aí depois de conseguir enviar e o sistema aceitar falta documento, assinatura, abrir conta naquele único banco que você não tem. E depois de meses tentando regularizar um projeto de pesquisa para incentivar os alunos, você ainda tem que pensar nos milhares de relatórios para fazer quando tudo isso acabar. É um Deus nos acuda.

Burocratizar a saúde, a educação e tudo o que conhecemos, infelizmente já é costume. O grande problema que essa burocratização está gerando é que agora ela virou moda. Burocratizamos o amor, o carinho, a atenção, a amizade e todos os sentimentos mais puros que somos capazes de sentir. Tomemos como exemplo um relacionamento amoroso, porque eu sei que no fundo todo mundo adora uma linda história de amor. A garota vê aquele cara bonito na faculdade, mas não pode simplesmente ir falar com ele porque é contra os princípios da sociedade. Pra não parecer tão “oferecida” ela adiciona ele em alguma rede social, facebook ou whatsapp atualmente. Aí ela tem que esperar ele puxar papo e se ele não puxar tudo isso só foi burocracia. Hoje em dia quando é o homem que se apaixona é basicamente a mesma coisa. Com a amizade é igual, com o carinho que vamos dar ou receber também.

Carinho é outro caso interessante. Temos medo de simplesmente dá-lo. Temos que pesquisar, conhecer pra saber se vale a pena. Tão mais fácil deixar acontecer. O pior é que sabemos disso, mas como estamos acostumados a preencher, repreencher, pensar, repensar, é como se não fizesse sentido simplesmente dar de coração. Entregar com confiança sem esperar nada em troca. Deixar rolar.

Pense como a vida seria mais legal se fosse simples. Se a gente amasse por amar, se a gente fosse amigo só pela companhia, se a gente fosse ser feliz só por ser. Sem papéis, sem formulários, sem milhares de documentos e números para serem gravados. Enfim, seria mais ou menos como viver eternamente como criança. Falar uma língua mais ou menos complicada, dar um abraço mais ou menos apertado, comer doce mais ou menos sem culpa, rir de uma piada mais ou menos. Pensando bem uma vida mais ou menos seria bem mais legal.

Bom, acho que é mais ou menos o recado que eu quero deixar dessa vez. Sem frases marcantes e sem pensamentos profundos. É só pra desburocratizar mesmo. Viver mais ou menos enrolado, mais ou menos preocupado. Agora quanto ao amor e a amizade esses sim têm que ser sempre mais. Nada de mais ou menos nesses aspectos. Nada de burocracia. E você que está apaixonado por aquela mulher, moça, menina ou vice-versa, pegue aquele chocolate e abra logo o jogo, porque até você adicionar no facebook ele pode ser esquecido como o Orkut e toda aquela burocracia mais uma vez não terá adiantado nada.

FIRMINO JÚNIOR, bambuiense, é professor na PUC Minas e no Instituto Federal, também jornalista e escritor, tem mestrado na área de Comunicação. Contato:firmino.junior@yahoo.com.br